Associação entre a realização de interrupção voluntária da gravidez e a tipologia de cuidados de saúde primários: um estudo transversal

Autores

  • Catarina Neves Santos Mestre em Medicina; Interna de Formação Específica em Medicina Geral e Familiar, USF Ramada, ACeS Loures-Odivelas, ARS Lisboa e Vale do Tejo, Lisboa, Portugal. http://orcid.org/0000-0003-3232-1928
  • Beatriz Chambel Mestre em Medicina; Interna de Formação Específica em Medicina Geral e Familiar, USF Novo Mirante, ACeS Loures-Odivelas, ARS Lisboa e Vale do Tejo, Lisboa, Portugal; Assistente Convidada – Instituto de Histologia e Biologia do Desenvolvimento – Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa.

DOI:

https://doi.org/10.32385/rpmgf.v38i4.13207

Palavras-chave:

Aborto legal, Serviços de planeamento familiar, Cuidados de saúde primários, Comportamento contracetivo

Resumo

Introdução: Melhor desempenho nos cuidados de planeamento familiar (PF) permitiria, teoricamente, reduzir as taxas de gravidezes indesejadas e, consequentemente, as interrupções voluntárias da gravidez (IVG).

Objetivos: Verificar a existência de associação entre fatores organizacionais dos cuidados de saúde primários (CSP) e o recurso à consulta de IVG do Hospital Beatriz Ângelo, na população de mulheres que a esta recorreu durante o ano de 2018.    

Métodos: Estudo observacional, analítico e transversal. Os dados foram colhidos da base de dados da consulta de IVG do ano 2018 e do Registo de Saúde Eletrónico. Foi realizada uma análise estatística descritiva e inferencial utilizando o programa SPSS®.      

Resultados: Cerca de 39,1% das mulheres que realizaram uma IVG pertenciam a uma UCSP, 38,3% a uma USF modelo A e 22,6% a uma USF modelo B, sendo que 21,5% não tinham médico de família (MF). Após ajuste dos dados verificou-se que as utentes de uma USF modelo B ou com MF realizaram significativamente menos IVG (p=0,009 e p=0,001, respetivamente). As utentes de USF modelo B tiveram mais consultas nos CSP (p<0,001) e utilizaram mais métodos contracetivos (p=0,022) nos 12 meses prévios à IVG. Também as mulheres com MF realizaram mais contraceção no ano anterior à IVG (p<0,001).

Conclusões: O melhor acesso aos CSP e o maior uso de contraceção que se verificam entre as utentes de USF modelo B ou com MF associam-se a uma menor realização de IVG. Ter MF mas, principalmente, pertencer a uma USF modelo B revela-se protetor face à realização de IVG, evidenciando a necessidade de atribuir MF a toda a população, melhorar a acessibilidade aos serviços de PF e incentivar a autonomia organizacional ao nível dos CSP.

Downloads

Não há dados estatísticos.

Referências

Sedgh G, Bearak J, Singh S, Bankole A, Popinchalk A, Ganatra B, et al. Abortion incidence between 1990 and 2014: global, regional, and subregional levels and trends. Lancet. 2016;388(10041):258-67.

Yogi A, Prakash KC, Neupane S. Prevalence and factors associated with abortion and unsafe abortion in Nepal: a nationwide cross-sectional study. BMC Pregnancy Childbirth. 2018;18:376.

Llorente-Marrón M, Díaz-Fernández M, Méndez-Rodríguez P. Contextual determinants of induced abortion: a panel analysis. Rev Saude Publica. 2016;50:8.

Rodriguez-Alvarez E, Borrell LN, González-Rábago Y, Martín U, Lanborena N. Induced abortion in a Southern European region: examining inequalities between native and immigrant women. Int J Public Health. 2016;61(7):829-36.

Zurriaga O, Martínez-Beneito MA, Galmés Truyols A, Mar Torne M, Bosch S, Bosser R, et al. Recourse to induced abortion in Spain: profiling of users and the influence of migrant populations. Gac Sanit. 2009;23 Suppl 1:57-63.

Peipert JF, Madden T, Allsworth JE, Secura GM. Preventing unintended pregnancies by providing no-cost contraception. Obstet Gynecol. 2012;120(6):1291-7.

Birgisson NE, Zhao Q, Secura GM, Madden T, Peipert JF. Preventing unintended pregnancy: the contraceptive CHOICE Project in review. J Womens Health. 2015;24(5):349-53.

World Health Organization. Safe abortion: technical and policy guidance for health systems [Internet]. Geneva: WHO; 2015. Available from: https://apps.who.int/iris/bitstream/handle/10665/173586/WHO_RHR_15.04_eng.pdf

Singh S, Remez L, Sedgh G, Kwok L, Onda T. Abortion worldwide 2017: uneven progress and unequal access [homepage]. New York: Guttmacher Institute; 2018. Available from: https://www.guttmacher.org/report/abortion-worldwide-2017

Direção-Geral da Saúde. Relatório dos registos das interrupções da gravidez: dados de 2016. Lisboa: DGS; 2017.

The Contraception Atlas. Limited access: Europe’s contraception deficit - a white paper [Internet]. Brussels: The European Parliamentary Forum on Population and Development; 2018. Available from: https://www.epfweb.org/sites/default/files/2020-05/786209755_epf_contraception-in-europe_white-paper_cc03_002.pdf

Direção-Geral da Saúde. Relatório dos registos das interrupções da gravidez, 2018. Lisboa: Direção-Geral da Saúde; 2018.

Levine EM, editor. Induced abortion. DynaMed [Internet]; 2018 [cited 2019 Feb 5]. Available from: https://www.dynamed.com/procedure/induced-abortion

Upadhyay UD, Desai S, Zlidar V, Weitz TA, Grossman D, Anderson P, et al. Incidence of emergency department visits and complications after abortion. Obstet Gynecol. 2015;125(1):175-83.

Gerdts C, Dobkin L, Foster DG, Schwarz EB. Side effects, physical health consequences, and mortality associated with abortion and birth after an unwanted pregnancy. Womens Health Issues. 2016;26(1):55-9.

Raymond EG, Grimes DA. The comparative safety of legal induced abortion and childbirth in the United States. Obstet Gynecol. 2012;119(2 Pt 1):215-9.

Limoncin E, D’Alfonso A, Corallino C, Cofini V, Di Febbo G, Ciocca G, et al. The effect of voluntary termination of pregnancy on female sexual and emotional well-being in different age groups. J Psychosom Obstet Gynaecol. 2017;38(4):310-6.

Campo-Arias A, Herazo E. Voluntary interruption of pregnancy in Colombia: contributions to the debate from public mental health. Rev Colomb Psiquiatr. 2018;47(4):201-3.

Biscaia AR, Heleno LC. Primary health care reform in Portugal: Portuguese, modern and innovative. Cienc Saude Colet. 2017;22(3):701-11.

Lapão LV, Pisco L. A reforma da atenção primária à saúde em Portugal, 2005-2018: o futuro e os desafios da maturidade [Primary health care reform in Portugal, 2005-2018: the future and challenges of coming of age]. Cad Saude Publica. 2019;35(Suppl 2):e00042418. Portuguese

Teixeira CJ. Diferentes modelos organizativos de cuidados de saúde primários apresentam diferenças no desempenho? [dissertation]. Faro: Faculdade de Economia da Universidade do Algarve; 2017.

Entidade Reguladora da Saúde. Estudo sobre as Unidades de Saúde Familiar e as Unidades de Cuidados de Saúde Personalizados [Internet]. Porto: ERC; 2016. Available from: https://www.ers.pt/uploads/writer_file/document/1792/ERS_-_Estudo_USF_e_UCSP_-_final.pdf

Serviço Nacional de Saúde. Bilhete de identidade dos cuidados de saúde primários [homepage]. Lisboa: Ministério da Saúde; 2019 [cited 2019 Dec 6]. Available from: https://bicsp.min-saude.pt/pt/Paginas/default.aspx

Ferreira PL, Raposo V. Monitorização da satisfação dos utilizadores das USF e de uma amostra de UCSP [Internet]. Coimbra: Centro de Estudos e Investigação em Saúde da Universidade de Coimbra; 2015. Available from: https://www.acss.min-saude.pt/wp-content/uploads/2016/11/Estudo_CSP.pdf

Pereira A, Nunes C, Botelho H, Biscaia JL, Barbosa M, Oliveira M, et al. Avaliação custos-consequências das USF B e UCSP 2015: unidades funcionais dos CSP como centros de resultados [Internet]. Lisboa: Coordenação Nacional para a Reforma do SNS; 2018. Available from: https://www.sns.gov.pt/wp-content/uploads/2018/02/CNCSP-Avalia%C3%A7%C3%A3o_USF-1.pdf

Santos CN, Chambel B, Prado González JJ. Perfil das mulheres que realizam interrupções voluntárias da gravidez: um estudo transversal [Profile of women who have voluntary interruptions of pregnancy: a cross-sectional study]. Acta Obstet Ginecol Port. 2022;16(1):10-21.

Downloads

Publicado

2022-09-13

Como Citar

Santos, C. N., & Chambel, B. (2022). Associação entre a realização de interrupção voluntária da gravidez e a tipologia de cuidados de saúde primários: um estudo transversal. Revista Portuguesa De Medicina Geral E Familiar, 38(4), 372–80. https://doi.org/10.32385/rpmgf.v38i4.13207

Artigos mais lidos do(s) mesmo(s) autor(es)